15 de dezembro de 2004

Poética

Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto
expediente protocolo e manifestações de apreço ao sr. diretor
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário o cunho vernáculo de um vocábulo Abaixo os puristas
Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis
Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja fora de si mesmo.
De resto não é lirismo
Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante exemplar
com cem modelos de cartas e as diferentes maneiras de agradar às mulheres, etc.
Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbados
O lirismo difícil e pungente dos bêbados
O lirismo dos clowns de Shakespeare
- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.
(Manuel Bandeira)

Eis ai as sabias palavras do meu escritor preferido, Manuel Bandeira; a primeira vez que li Manuel, fiquei me perguntando como o simples, o cotidiano, o que parece tão insignificante pode ser tão mágico...
como as frases não precisam ser corretas, como o não dizer nada pode significar mais que uma enorme quantidades de palavras...
É que Manuel tem sempre um poder de expressar aqueles sentimentos, aquelas experiencias que nós por mais que busquemos palavras não sabemos explicar...
só sentir...

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